Divina entrevista com a pirata Dandi!

Na Divina entrevista desse mês temos outra artista e que já trabalho com alguns jogos muito conhecidos no Brasil como Pablo e Don Capollo, ambos jogos também nacionais. Uma jogadora de jogos de mesa, artista e também consumidora ávida de cultura geek: Daniele Rios ou simplesmente Dandi!

Quem é a Daniele?
Sou uma pessoa que sempre foi vidrada em desenho, arte e jogos. Fui daquelas que decidiu desde cedo que queria trabalhar desenhando e acabei levando isso por toda a vida. Artisticamente adotei o nome Dandi e sempre andei entre a área da literatura, jogos de tabuleiro, jogos de console, longas campanhas de RPG… até o hobby virar profissão foi quase tão natural que mal percebi que já estava mergulhada nisso.

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Como começou nos jogos? Lembra de qual foi o primeiro jogo de tabuleiro que jogou? Se sim, ainda o tem na coleção?
Eu jogava muito os clássicos quando criança, algo de quem cresceu entre os anos 80 e 90… Monopólio, Jogo da Vida, War e meu favorito na época: Detetive! Demorei até ter um console, então minha alegria com a criançada era chamar os amigos para jogar joguinhos de tabuleiro, já que minha mãe ficava preocupada de sua filha menina se arriscar a se machucar correndo na rua. Tive eles guardados por muito tempo, mas as peças foram se perdendo e o costume de se encontrar com amigos para jogar tabuleiro foi minguando. Então eu descobri os jogos de RPG, logo foi aquela paixão à primeira vista… era diferente, meio narração, meio estratégia, rapidinho já estava viciada!

Já no início da vida adulta, durante encontros de RPG, acabei descobrindo novos jogos de tabuleiro e redescobri um mundo que estava muito além de Monopólio. Dali pra frente passei a jogar mais em luderias ou encontros com amigos. Curiosamente eu nunca pensei que poderia trabalhar especificamente com jogos. Acho que tinha aquela visão que só gringo faz esse tipo de coisa, então achei que ia dedicar minha arte aos quadrinhos e mercado editorial…. quase sem perceber acabei caindo na área de jogos, o que foi uma enorme alegria, já que era um hobby meu. Por frequentar alguns encontros de RPG, acabei fazendo contatos com “boardgamers” e logo passei a trabalhar com isso!

Quais são os jogos de mesa que possuem sua arte? Como foi essa experiência?
A parte mais dolorosa de se fazer a arte para alguns jogos é que metade não saiu e não posso revelar ainda! Mas tenho trabalhado diretamente com o game designer Gustavo Barreto há alguns anos, nosso primeiro jogo lançado foi o Don Capollo, que particularmente é um dos mais refinados que já fiz. Depois disso fiz o logo e alguns ícones de Dark City, e mais 3 jogos educativos/publicitários. Também trabalhei com a Funbox na segunda edição de Pablo, onde pude fazer a arte da caixa e das cartas. Tenho todas as artes prontas para um lançamento que ainda não temos data e mais dois jogos em andamento… se estou ansiosa pra anunciar? Sempre! Mas vamos esperar a parte burocrática das editoras…
Eu particularmente sou apaixonada por trabalhar com jogos de tabuleiro! O Gustavo sempre me deu liberdade criativa, então sempre pude extrapolar e pensar em conceitos completamente diferentes para cada jogo, o que é um prazer para qualquer designer. Transportar o(a) jogador(a) em cada cor, detalhe, e levar a ele(a) o mesmo encanto que eu tinha quando comecei, é muito satisfatório profissionalmente.

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Carta de Don Capollo, Devir

O público reconhece você como artista desses jogos? Te recebem bem?
Para ser sincera… acho que ninguém me conhece além das pessoas com quem trabalho ou jogo. Quando vou aos eventos não costumo me anunciar como artista nem mesa do meu próprio jogo, sinto como se fosse me vangloriar e soasse arrogante da minha parte (o que não faz sentido, pois não sou tímida e deveria melhorar meu marketing pessoal!). Geralmente quem me apresenta são meus colegas de produção mesmo. Quando os jogadores entendem a mim como artista do jogo em questão, me recebem muito bem! É até curioso, vejo muita gente reconhecer os designers dos jogos, mas o artista ficar sumido em alguns créditos, o que acho um pouco triste… talvez isso leve o público a procurar conhecer menos a gente.

Vi que você trabalha com traçados diferentes. Quais as principais inspirações para suas artes?
Parte da minha personalidade se reflete nas minhas artes… eu adoro explorar coisas diferentes, cenários diferentes e acabo sempre trabalhando traços diferentes! Quando comecei a estudar para me tornar ilustradora, eu fui guiada pelo mestre Alexandre Jubran a não estagnar apenas no meu estilo e aprender a me adaptar melhor ao mercado… ainda que eu tenha meu traço de preferência, acho instigante ter que reestudar traços e cores novas para transmitir uma emoção diferente, parte do meu aprendizado na faculdade de design.

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Capa do jogo Pablo, segunda edição

Quando desenho informalmente, gosto de focar em lineart, e tenho um estilo que associo melhor aos quadrinhos europeus (Massimiliano Frezzato, Moebius), com um toque de arte oriental e ocidental tudo junto. Quando o jogo exige algo mais pesado como Don Capollo, me inspiro no próprio cinema noir, com destaque aos vermelhos como no filme “Os Intocáveis” de Brian De Palma (já falei que sou apaixonada por cinema?). Quando tenho que partir para fantasia, tenho um pacote de referências, desde mangás (Yukito Kishiro, Akihiro Yamada) até artes da revista Reavy Metal, com uma pitadinha de Todd Lockwood (vibrava nas artes de D&D 3.5, RPG é minha paixão) e Dave McKean (eu sei que vocês apreciam Sandman também! Sou ávida por quadrinhos!). Minha bagagem é bem diversa, por conta disso toda vez que recebo uma nova proposta de jogo eu procuro alguma referência diferente que eu tenha tido anteriormente ou procuro novas referências e vejo como consigo traduzi-la para minhas capacidades, propondo ela aos clientes. O resultado vocês vêem nos produtos!

Existe algum projeto que você gostou mais de trabalhar?
Eu gostei muito de trabalhar em praticamente todos os projetos que assumi, mas de certa forma tenho um carinho especial com Don Capollo, pois foi meu primeiro lançamento de tabuleiro! Na época tinha um pouco mais tempo pra ele, e não precisava me estressar com prazos apertados e mil trabalhos na fila.

Já trabalhou com RPG ou jogos digitais? Se sim, quais?
Atualmente estou empregada numa empresa de jogos digitais e trabalho num MMORPG em pixel arte com estilo retrô. Já trabalho com jogos há 11 anos variando entre o digital e analógico, mas nesses últimos 6 anos estou com o projeto Bloodstone: The Ancient Curse, um jogo gratuito que todos podem jogar. Além dos concept arts, algumas outfits e personagens, eu tenho trabalhado bastante com cenário. Só não consegui trabalhar diretamente com algum livro de RPG de mesa ainda, o que é uma tristeza, pois sempre foi meu sonho!

Um divino spoiler de um projeto futuro… Por favor!
Posso adiantar que muitos projetos onde trabalhei ainda estão por vir! Só depende do tempo de produção e prioridade de projetos. Entretanto, um projeto “secreto” está com previsão para lançamento em 2021 e trata-se de um jogo colaborativo de sobrevivência num Brasil apocalíptico em pleno inverno nuclear sendo baseado num livro nacional lançado nos anos 80. A arte é mais densa e realista, acompanhando o tom distópico.
Adianto também que esse final de ano estou trabalhando num jogo festivo mais alegre também com personagens “cartoonescos” e uma história mais engraçada!

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Projeto ainda secreto para breve lançamento

Por fim, uma dica para quem quer continuar na carreira de artista, dentro ou fora do mercado de jogos!
Uma dica que sempre dou a todos os artistas criativos: bagagem cultural é essencial! Quando mais você explora e consome, melhor é a sua capacidade de solucionar uma ideia ou proposta. Se o artista só consome um estilo de produto, ele fica estagnado e quando me refiro a bagagem estou me referindo a tudo: arte, quadrinhos, música, cinema, jogos, história da arte, etc. E por fim, trabalhar com jogos de tabuleiro não é simples se você tiver muita ansiedade: é preciso ter paciência! Um projeto demora para produzir, aprovar, vender… não é um mercado em alta velocidade no Brasil e as vendas raramente são enormes, então é melhor se forçar em fazer algo de qualidade e que te traga prazer. Quanto mais amor e técnica se coloca no produto, mais chances o produto tem de vencer!

Ainda sobre essas dicas, eu tenho trabalhado constantemente com a mesma equipe (sabe como é, time campeão nós não mudamos!) que se trata do Gustavo Barreto (game designer), Maria do Carmo Zanini (tradutora e profissional de editoração) e Cris Viana (design gráfico). Cheguei a dividir algumas artes de um projeto não lançado com a Gabriela Nascimento, mas não sei se ela fez mais coisas com jogos de tabuleiro.

Para entrar em contato com a artista Dandi veja seu portfólio ou redes sociais!