Resenha – Resident Evil: Deckbuilding game

“Eles fugiram para a mansão, onde pensavam estar a salvo… por enquanto.” – Resident Evil, jogo de Playstation 1

O ano de 1996 seria um marco na história dos videogames. Neste ano era lançado o primeiro Resident Evil, jogo da desenvolvedora Capcom que seria responsável por criar todo um novo estilo de jogo – o “survival horror”. De lá para cá, dúzias e dúzias de jogos, spin-offs e produtos relacionados foram lançados, entre continuações e uma série de filmes de qualidade duvidosa. Curiosamente, nesta profusão de zumbis, só existe um jogo de tabuleiro baseado na franquia: Resident Evil: Deckbuilding game.

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Caixa

RE: DBG é, como o nome indica, um deckbuilding, estilo de jogo popularizado por Dominion (lançado aqui pela Conclave Editora) e Ascension (lançado pela Mandala Jogos). Nos deckbuildings (ou jogos de construção de baralhos) sendo essencialmente jogos de cartas, cada jogador começa com um baralho igual com os mesmos recursos, e deve durante a partida comprar novas cartas para melhorar e alterar o baralho, criando uma estratégia para vencer. Alguns jogos possuem o que chamo de “trilha de cartas” na qual novas cartas entram de forma aleatória; já outros possuem uma “área de compra” na qual todas as cartas estão disponíveis a todos.

RE: DBG se encaixa nesta última categoria. Cada jogador começa com dez cartas – sete de ammo (munição) e três armas, e pode durante seu turno realizar uma vez cada uma das ações do jogo: comprar, agir e explorar. Cada carta de munição dá ao jogador dois tipos de moeda: gold (ouro) e ammo (munição). Com o ouro ele comprar uma (e somente uma) carta da área de compra que vai para a pilha de descarte – mais tarde, quando o descarte for reembaralhado para formar o baralho, a carta estará lá disponível. O jogador pode também usar uma ação para jogar de sua mão uma (e somente uma) carta que tenha sido previamente comprada, conferindo bônus diversos.

A terceira ação possível é o que mais diferencia RE: DBG dos demais – “explore”. Existe um baralho separado, chamado de mansion, que simula a Mansão Spencer do primeiro jogo e que cria todo um clima de suspense sem o qual um jogo de RE não poderia ser chamado como tal. Nele existem diversos infectados, inimigos zumbis dos diversos títulos da franquia. Usando a ação de explorar o jogador pode usar as cartas de armas que tiver jogado no turno (após pagar pelos seus custos em munição) para revelar uma (e somente uma) carta do topo do baralho de Mansão. Cada arma causa certa quantidade de dano, e seu dano total precisa ser igual ou maior que aos pontos de vida do infectado revelado. Se isso acontecer, o jogador mata o inimigo e fica com a carta para si, ganhando condecorações. Caso contrário, o infectado devolve o golpe e causa dano no jogador.

“MORRIR ES VIVIR”
Esse dano é sofrido pelo personagem do jogador – outro fator diferente de RE:DBG. Cada personagem (figuras conhecidas como Chris Redfield, Ada Wong, Jill Valentine, Albert Wesker e outros) possui vida, e se os danos foram suficientes para matar o personagem, ele fica momentaneamente fora da partida: o jogador embaralha mão, baralho e descarte e vira sua carta de personagem para baixo. No seu próximo turno, o jogador desvira o personagem, compra uma nova mão de cinco cartas e fica com um marcador que diminui a vida máxima do personagem em 20 pontos – e se a vida máxima acabar, é game over.

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Cartas de personagens

O jogo termina quando o “boss” da Mansão é derrotado. Quando isso acontece, os jogadores contam as condecorações que possuem e quem tiver a maior quantidade vence. As condecorações também têm a função de “pontos de experiência”, pois os personagens possuem habilidades que são ativadas quando o jogador junta certa quantidade de Condecorações.

O jogo poderia ser bem previsível (e realmente o é no começo, como a maioria dos deckbuildings), mas conforme a partida se desenrola, diversos efeitos alteram as coisas. Actions geralmente permitem ao jogador burlar a limitação de uma Compra/Ação/Exploração por turno, aumentam o dano das armas, curam danos. Armas possuem efeitos especiais como dar Explorações adicionais. Os próprios Infectados possuem efeitos quando são ou não são derrotados. E a Mansão ainda esconde prêmios para os mais corajosos – ervas que aumentam a Vida máxima, armas especiais, tesouros, eventos e mais.

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As cartas e manual. Foto: BGG

“¡DETRÁS DE TI, IMBECIL!”
Mas, assim como aquele momento em que o Nemesis quebra a parede da delegacia e acaba com sua felicidade, RE: DBG tem seus contras. O principal é a dependência de sorte – diversas vezes você vai comprar cartas pro turno e ver a si com cinco armas, sem poder pagar por nenhuma delas nem comprar nada da mesa, ou com uma carta que te permite pegar uma arma do descarte logo após ter reembaralhado o descarte todo (claro que isso é contornável com um bom planejamento, mas pode acontecer). As cartas usam imagens tiradas dos jogos mais recentes da franquia, o que pode desagradar muita gente, e o design das cartas não é exatamente o mais bonito do mundo dos boards, com muita poluição visual e letras muito pequenas.

Mas o pior de tudo talvez seja o fato de que a Bandai – detentora dos direitos do jogo – tenha descontinuado os lançamentos, após uma caixa básica e quatro expansões (duas delas “stand-alone”, ou seja, que funcionam como expansões e como caixas base novas) que, juntas, somam quase 500 cartas, mais de 50 personagens e diversos extras e modos de jogo que podem deixar a partida mais diversificada, como cartas de Skills, modo Player VS Player, Time Attack e outros. Hoje, RE:DBG é um jogo relativamente raro, e só aparece à venda por valores um tanto surreais.

“LEON! HELP!” (ou “Considerações finais”)
De todos os deckbuildings que joguei, Resident Evil: Deckbuilding Game foi o mais interessante. Consegue ser estratégico o suficiente devido às decisões de quais cartas comprar, mas mantém um clima de suspense na hora de revelar as cartas da mansão, assim como acontecia a cada curva feita na Mansão Spencer do jogo original.

Com todos os modos diferentes de jogo e possibilidades aparentemente infinitas de jogabilidade devido à quantidade de personagens, cartas e efeitos, se for possível passar pelo design gráfico pobre e poluído terá um jogo divertido e empolgante.

Lembre-se de levar o abre-portas! Pode ser útil se você, o mestre do arrombamento, levá-lo consigo.

Pontos positivos
– Fãs da franquia vão reencontras personagens, vilões, monstros e situações clássicas de Resident Evil
– Estratégico na medida certa sem deixar de lado uma dose de suspense
– Dúzias de possibilidades com a quantidade de expansões, cartas e personagens

Pontos negativos
– Feio igual ao Tyrant
– Atualmente raro e caro
– Dependência mediana de idioma, apesar de muitas cartas serem iconográficas