Resenha – Village

“A vida na vila é difícil! Mas pelo menos oferece aos seus habitantes muito espaço para se desenvolverem. Alguns podem querer fazer carreira na câmara do conselho, alguns na igreja, enquanto outros se aventuram pelo mundo…” Manual oficial, página 2

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Capa da versão brasileira. Foto: Divulgação

Afinal de contas, o que se espera da história de alguém: ser lembrada para sempre no livro de histórias de sua terra natal ou simplesmente ser esquecida como se fosse qualquer uma? Através dessa ideia é que Village se desenvolve com seus habitantes (trabalhadores) morrendo e sendo colocados no livro de crônicas da vila.

Lançado em 2011 pelo famoso casal Markus e Inka Brand, já famosos por títulos como La Boca, A castle for all seasons e outros, o jogo foi vencedor do prêmio Spiel des Jahres Kennerspiel de 2012 o que só aumento sua fama pelo mundo. Hoje, em 2017, o jogo já foi traduzido várias língua e também foi ganhador de outros prêmios que o tornaram referência quanto ao trabalho do casal. Além disso, foi trazido ao Brasil pela editora capixaba Fire on Board jogos e essa resenha é com base na versão brasileira do jogo.

Mecânicas
– Alocação de trabalhadores
– Colecionar componentes

Em Village cada jogador comanda uma família que precisa se desenvolver, seguir carreira, produzir ou comercializar produtos e atender clientes para prosperar e, como todo euro, dar pontos de vitória. Além disso, ainda é possível viajar pelo mundo, aumentar a família e matar – sim, matar –  os membros da família para conseguir mais pontos de vitória no fim do jogo.

Cada jogador recebe uma pequeno tabuleiro que representa a sua fazenda nos arredores da vila. Nesta fazenda é possível abrigar os membros da família que acabaram de “nascer”, produzir grãos para venda ou uso posterior. Ainda é possível aumentar a capacidade de produção da mesma com animais e arado. Além disso, cada um começa uma a primeira geração da família que contém 4 membros (todos com adesivos de número 1) e que já permite alocar 4 trabalhadores no tabuleiro principal.

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Tabuleiros ou fazendas dos jogadores. Foto: Boardgamegeek

Entretanto já é aqui na fazenda de cada jogador que temos o diferencial de Village: a trilha de tempo. Conforme as ações no tabuleiro principal são realizadas o tempo é consumido e conforme o tempo passa, algum familiar deve morrer. Porém aqui a morte também algo bom: pontos de vitória!

O jogo começa com o tabuleiro sendo preenchido com cubinhos de recursos – cada um possui uma cor diferente – além dos cubos de praga que aceleram o tempo de cada jogador como se fosse uma pequena penalidade. A cada vez que chega a vez de alguém, um cubinho deve ser pego a fim de que alguma ação naquele espaço seja realizada.

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Cubinhos, tiles e meeples. Foto: Boardgamegeek

Em se tratando de espaços e ações, Village possui um tabuleiro cheio dos dois. Existe a área de manufatura, da igreja, da câmara do conselho (normalmente chamada de “prefeitura”), viagem e outros. Em se tratando de áreas para ações e alocações de trabalhadores no tabuleiro temos abaixo na imagem editada:

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As diferentes áreas do tabuleiro

Mercado (azul) – Aqui é o local onde os produtos dos jogadores são entregues a clientes. É a chance de fazer pontos de vitória para o final do jogo. Cada cliente aceita os produtos do jogo base e das expansões também (quando as mesmas estão em jogo).

Viagem (verde) – O local da viagem é onde um dos trabalhadores de cada jogador vai viajar a fim de conhecer novos horizontes. Apesar de alguns trechos da viagem custarem caro, também valem muitos pontos do jogo, o que pode fazer a diferença ao final total da partida.

Manufatura (amarelo) – A área da manufatura é a “menina do olhos” do jogo. Lá é possível alocar trabalhadores para produzir bens ou criar animais, além também ser possível simplesmente comprar tudo sem produzir nada. Adicionalmente é a única área do jogo em que é possível fazer moedas (dinheiro!) que também é o “coringa” do jogo.

Câmara do conselho (vermelho) – Aqui fica uma parte muito interessante do jogo. Além de ganhar pontos, cada espaço da câmara (também chamada carinhosamente de “prefeitura” por aqui) dá ao jogador benefícios que ele pode usufruir como conseguir bens manufaturados gratuitamente, pegar cubos de recursos, ser o primeiro jogador ou ainda transformar dinheiro em pontos de vitória imediatamente. A melhor parte: isso pode ser feito várias vezes em uma rodada, enquanto existirem cubinhos naquele espaço.

Igreja (marrom) – Em Village a igreja tem uma pequena mecânica bem interessante. Os jogadores colocam seu trabalhador em um saquinho preto que já vem com o jogo e somente no final da rodada, quando se acabam os cubinhos de todo o tabuleiro, serão sorteados 4 meeples de dentro do saquinho. Porém já existem 4 “monges” (meeples pretos) lá dentro, o que pode atrapalhar os planos de quem aposta na igreja. Caso contrário, fica na saquinho para a próxima rodada. Quem vai para a igreja vale pontos de acordo com o investimento de cada jogador.

Casamento e colheita (rosa) – Existem duas pequenas áreas da mesma cor no tabuleiro que são as áreas para casar e aumentar a família e colher os grãos da fazenda. No casamento é possível aumentar a família adicionando um novo membro à fazenda da geração imediatamente posterior ou retornar algum trabalhador que esteja no tabuleiro para a fazenda. Já na parte da colheita cada jogador consegue sacas de grãos de acordo com o que possui na fazenda para essa produção: Um animal e um arado confere mais grãos do que meramente um único trabalhador.

Além todas essas áreas ainda existe no tabuleiro o livro de crônicas da vila, o poço dos desejos e as valas anônimas (enterro de indigente!). O livro de crônicas da vila registra e dá pontos para os valorosos membros da vila que fizeram história como carroceiros, ferreiros, secretários da câmara e assim por diante. Para cada trabalhador que morre, o jogador verifica onde ele morreu e coloca o trabalhador correspondente no livro de acordo com o local onde aquele trabalhado trabalhava. Dessa forma, cada trabalhador marca pontos no final do jogo se o for alocado devidamente nos “escudos de cores” de onde ele “morreu”. Na prática:

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Cada um vai para a sua cor garantindo pontos de vitória ao final da partida. E quando não tem mais espaço na crônicas da vila? Então aí entram as valas anônimas. Não valem pontos, mas contabilizam para o final.

Por fim ainda existe o poço dos desejos que permite realizar uma determinada ação de um espaço qualquer pagando 3 cubinhos da mesma cor para o jogo. Quando acabam os cubinhos de determina espaço de ação ou ainda só existem cubinhos de praga (que não contam como recursos, mas penalizam o jogador em -2 tempos), o poço do desejo pode salvar a estratégia.

Quando o livro de crônica da vila enche ou ainda as valas anônimas, então o jogo finalmente se encerra. É o momento de fazer a missa final na parte da igreja, verificar quem ainda vai no poço de desejos e verificar as pontuações dos clientes, moedas e nas áreas do tabuleiro.

Quem tiver mais pontos ganha, como todo bom euro. Em caso de empate quem atendeu mais clientes vence e se ainda assim empatar, quem possuir mais membros da família “vivos”, seja no tabuleiro do jogador (fazenda) seja no tabuleiro central, ganha.

Considerações finais
Village é um euro de média complexidade com decisões pouco difíceis a serem realizadas.  Certamente é um jogo acima da média, tanto que ganhou o prêmio Spiel de Jahres em 2012. A arte do tabuleiro é fantástica e todos componentes são ótima qualidade. Uma partida entre 4 jogadores costuma durar em torno de 1 hora à 1 hora e 30 minutos.

A rejogabilidade é mediana para mim. Os principais fatores que influenciam nessa questão são os cubinhos que sempre variam entre si e os clientes que também o fazem.  As áreas menores do jogo também pode ser levadas em consideração, pois nunca se sabe o quem vai ser sorteado na igreja, por exemplo. Porém é um jogo que traça muitos caminhos à vitória. Um jogador pode focar no mercado e atender clientes e mais clientes, ou ainda só viajar e acumular pontos para o final do jogo, por exemplo. Além disso, existem áreas que se complementam entre si, como a câmara com seus recursos gratuitos e o mercado. Não existe uma definição certa de qual é o melhor caminho, pois eu já vi jogadores perderem a partida por terem focado somente em uma única área do jogo.

Existe uma questão muito levantado pelos jogadores que é a falta de apoio temático quanto ao uso dos cubinhos no jogo ou ainda a falta de ligação entre o tema do jogo e os cubinhos. Acredito que a razão seja para limitar o uso de certas áreas do jogo, como o mercado por exemplo. Quando um jogador produziu ou comprou muitos produtos da manufatura, ele(a) teria como atender muita demanda. Se em toda rodada o mercado pudesse ser ativado quantas e quantas vezes o jogador quisesse, logo Village se tornaria muito desequilibrado. Claro que os cubinhos poderiam ser substituídos por outros tipos de marcadores mais temáticos, mas ainda assim isso não torna o jogo menos divertido.

Em suma, Village é um grande jogo! Vale a pena ter na coleção e é porta de entrada para outros euros mais complexos e pesados. Não ocupa muito espaço físico e todos os componentes cabem na caixa com facilidade, além de também ser possível de criar um organizador para o mesmo.

Pontos positivos
– Relativamente fácil de ensinar
– Decisões de média dificuldade com baixíssima sorte
– A ideia de morte dos trabalhadores é inovadora e muito bacana
– Vários caminhos à vitória
– Porta de entrada para jogos estilo “euro” mais pesados
– Arte, componentes e produção de alta qualidade

Pontos negativos
– Preparação de cada rodada do jogo um pouco demorada
– A parte da “viagem” do jogo base é cara (custo de recursos do jogo) e pouco compensadora
– Pouca interação entre os jogadores, mas isso não torna o jogo “seco”